terça-feira, 6 de julho de 2010

Adolescentes: mais altos, gordos e preguiçosos

Em uma tarde de sexta-feira do mês de abril, 21 meninas chegam à Rua Botucatu, no bairro da Vila Clementino, em São Paulo. Mochila ou bolsa pendurada em apenas um dos ombros, elas ocupam quase todas as carteiras de uma pequena sala e enchem o espaço com vozes e risadas. Além da faixa de idade, que varia entre 13 e 16 anos, têm em comum uma meta, reproduzida quase como um mantra: comer a cada três horas, não repetir e não beliscar.

Ali, na casa número 715, fica o Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente da Universidade Federal de São Paulo. As garotas participam voluntariamente do Programa de Atividade para o Paciente Obeso, o Papo. O tema do encontro nesse dia: o tamanho das porções. A fatia de melão, ensina a nutricionista Simone Freire, não deve ser mais larga do que uma caixa de fósforos.

Quantidades descomedidas à mesa ajudam a engordar a prevalência de obesidade em crianças e jovens brasileiros, que hoje é de 9%. “Nos anos 1960, a porção de batata frita era um terço menor que hoje”, compara a hebiatra Ines Pardo, coordenadora do projeto Adolescente Saudável, da Prefeitura de Sorocaba, no interior de São Paulo.

A oferta de produtos industrializados e a falta de tempo — que, convenhamos, já virou desculpa para tudo — também têm sua parcela de responsabilidade no aumento da silhueta dos jovens. “Os nossos hábitos alimentares, de modo geral, mudaram muito”, observa Vivian Ellinger, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), no Rio de Janeiro. Pesquisas mostram que, aqui no Brasil, estamos exagerando no sal e no açúcar, além de tomar pouco leite e comer menos frutas e feijão. E os adolescentes, ou seja, aqueles com idade entre 10 e 19 anos, não estão imunes às estatísticas.

Outro pecado, velho conhecido de quem exibe excesso de gordura por causa da gula, surge como marca da nova geração: a preguiça. “Cem por cento das meninas que participam do Papo não praticavam nenhum esporte”, revela a psicóloga Cristina Freire, que monitora o desenvolvimento emocional das voluntárias. Nos encontros semanais do grupo, elas frequentam aulas de educação física.

Você provavelmente já sabe quais são as consequências de uma rotina sedentária e cheia de gordura. “E não é novidade que os obesos têm uma sobrevida menor”, acredita Claudia Cozer, endocrinologista da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica. Mas, se há cinco anos os estudos projetavam um futuro sombrio para os jovens, no cenário atual as doenças que viriam na velhice já são parte da rotina deles. “Os adolescentes já estão sofrendo com hipertensão e diabete”, exemplifica Claudia.

Não há dúvidas de que hábitos saudáveis criados desde a infância são a maneira mais eficiente de mudar essa realidade. E é mais garantido aproveitar o organismo cheio de vida e energia da juventude do que deixar para resolver qualquer situação mais para a frente. “De um problema na coluna ao excesso de peso, tudo é mais fácil de corrigir na adolescência do que na vida adulta”, afirma Souza Lima.

A CULPA É DE QUEM?
Acredite: não vale a pena procurar um culpado. “Estamos, todos, falhando: escola, pais e profissionais de saúde”, sentencia Adroaldo Gaya, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e coordenador do projeto Esporte Brasil. “A abordagem deve ser multidisciplinar”, acredita.

Os especialistas concordam que, como é na escola que a meninada passa a maior parte do tempo, é essencial que ela ofereça um programa de orientação nutricional e incentive a prática de atividade física. “A alimentação deveria fazer parte do currículo escolar”, defende Vivian Ellinger, da SBEM, no Rio de Janeiro.

Só que não dá para jogar toda a responsabilidade sobre a instituição de ensino. “Os pais querem que os jovens mudem de hábitos e emagreçam sem alterar nada na rotina da própria casa”, observa Claudia Cozer. Quer dizer: a família toda deve entrar na dança. Sempre. A rotina atribulada e as longas jornadas de trabalho atrapalham, é verdade. Mas, faça as contas, preparar um sanduíche com queijos magros, peito de peru e alface não gasta mais tempo do que fritar um hambúrguer e colocar no pão. E já é um começo.

MOTIVAÇÕES DE SEMPRE
As gírias, a maneira de se comunicar, a idade em que começam ingerir bebida alcoólica... Muita coisa na vida dos adolescentes mudou nas últimas décadas. Mas, como seus pais ou seus avós na juventude, eles continuam sem saber o que os espera no futuro, ainda se locomovem em bandos e não dão muita trela aos insistentes alertas dos mais velhos. Talvez esteja aí o caminho para motivá-los à prática de exercícios, que deve ser realizada pelo menos duas vezes por semana. “Quando estão em grupo, até a caminhada fica divertida”, comenta Souza Lima.

É importante, principalmente nessa fase, sentir-se socialmente aceito. E o fato de praticar atividades físicas ao lado dos amigos é o maior incentivo que se pode oferecer a um jovem. Se bem informados, eles são perfeitamente capazes de compreender as vantagens de uma vida mais saudável. “Ora, eles querem crescer saudáveis, bonitos, com vigor”, diz Ines Pardo. A questão estética, aliás, é o que os locomove — e nada há de errado em apelar para ela por uma ótima causa, desde que colocando alguns pingos nos is.

No Papo, não é incomum que as meninas cheguem com o objetivo de perder peso apenas para ir a uma festa de 15 anos ou a uma formatura. Por isso mesmo, é preciso ficar atento a padrões de beleza — a busca exagerada por um perfil pode gerar frustração e, muitas vezes, causar distúrbios alimentares graves, como a anorexia.

O processo de conscientização deve passar pelos cuidados com a saúde, a noção de equilíbrio e as mudanças que podem ser feitas dentro do lar mesmo. Isso leva tempo. As meninas saíram da Unifesp naquela sexta-feira com uma lição de casa: trazer uma fotografia da sua geladeira. Revista Saúde