Embora a interrupção possa ser estridente, eu até acho bem-vindo o som agudo da música country ou o barulho de sinos de igreja que vêm do celular de um paciente durante uma sessão de psicoterapia. Entenda por quê.
O consultório de um psiquiatra é um lugar de confidências, então cuidei para torná-lo um espaço privativo. Minha sala de consulta é separada da sala de espera adjacente por duas paredes paralelas. A porta do consultório também é dupla. Uma máquina de barulho de fundo no corredor garante que ninguém consiga ouvir o que se diz dentro da sala de consulta. O paciente controla o movimento da informação, dentro e fora.
Neste tipo de espaço isolado, é fácil refletir e descobrir pensamentos na beira da consciência. Com este tipo de privacidade, fica mais fácil os pacientes se abrirem.
Porém, essa arrumação bizantina cria certas limitações. Que cônjuge do paciente já não se perguntou: “O terapeuta está captando a história completa?” Dentro da sala de consulta, o terapeuta só ouve a perspectiva do paciente. Tendo-nos colocado numa caixa, como podemos ajudar os pacientes a sair de suas caixas?
Uma solução para o dilema se apresenta quando meu paciente atende àquela ligação telefônica. O isolamento do consultório é despedaçado; o paciente permite que alguém de sua vida entre ali. E eu tenho o privilégio de presenciar a pessoa diante de mim interagindo espontaneamente com aquele mundo.
A maioria dos pacientes lida com uma ligação com um rápido pedido de desculpas; eles desligam seus celulares, surpresos por terem se esquecido de fazê-lo antes de entrar. Alguns selecionam suas chamadas, sempre disponíveis para pessoas selecionadas.
Outras pessoas não ligam para as interrupções e atendem o celular toda vez que sua musiquinha toca. Até mesmo suas conversas breves podem ser reveladoras: “Estou na psiquiatra”, “Estou na Dra. S”. Quem sabe eu não tenho apelidos? Para uma família, eu era a “Grande B” (apesar de eu ser baixinha, mesmo usando salto).
Uma mãe recebe uma ligação de sua filha adolescente. Um tema de nossas sessões tem sido como lidar com o “comportamento exigente” da filha. O volume está alto, então eu consigo escutar a mãe e a filha falando. A filha está insistindo em algo trivial; a mãe é infinitamente paciente, até solícita. Agora eu vejo que a criança não tem recebido feedback consistente de que seu comportamento é problemático. A culpa levou minha paciente a disfarçar sua irritação. Ela se surpreende em saber de mim o quanto ele tem se enganado e o quanto isso é contraproducente.
Quando o marido de outra paciente telefona para saber os resultados de seus exames médicos, sinto sua doçura; isso contrabalanceia meu conhecimento sobre suas dificuldades sexuais.
Um órgão soa do bolso do casaco de outro paciente, um jovem rapaz. “Aposto cem dólares que é minha irmã!”, ele diz. Claramente ela telefona muito para ele, e ele meio que gosta disso. Estranhamente, ele raramente a menciona em sua terapia. Agora eu sei por quê. Ele tinha medo de atrapalhar a doçura de seu relacionamento fraternal ao revelar sua essência competitiva.
Presencio outro paciente, um médico, fazendo malabarismo com diversas ligações: colegas precisam de um conselho urgente; criança quer dormir na casa de um coleguinha; esposa quer pedir que ele traga o jantar; enfermeiros temem infecções de ferimentos, febre, hemorragia. Realmente entendo o estresse envolvido em mudar incessantemente de assuntos de consequência trivial para aqueles casos de vida ou morte.
Às vezes, os pacientes me entregam seus celulares, para que eu leia suas mensagens. Nós as ouvimos e discutimos se discernimos as mesmas implicações sutis nas entrelinhas.
Os pacientes me mostram aquelas telas brilhantes com fotos dos bichinhos de estimação e dos filhos, apartamentos que eles podem alugar, a alergia da semana passada (para um diagnóstico ou para gerar empatia). Vejo a bagunça que se tornou foco das brigas de família: o quarto do filho com toalhas molhadas em cima de roupas limpas; a mesa de jantar desordenada que não permitiu jantares festivos.
Ao tentar compreender a infinita complexidade da mente de um individuo, ajuda centrar o foco fechando o mundo lá fora e criando um lugar de privacidade. Mas, para entender o contexto – a vida que o paciente leva fora do consultório –, ajuda deixar entrar algumas visões e sons. As imagens valem mais que mil palavras; com as vozes é a mesma coisa. Vídeos caseiros, agora disponíveis na maioria dos dispositivos móveis, logo mais vão estrear no meu consultório. Uol Saúde
O consultório de um psiquiatra é um lugar de confidências, então cuidei para torná-lo um espaço privativo. Minha sala de consulta é separada da sala de espera adjacente por duas paredes paralelas. A porta do consultório também é dupla. Uma máquina de barulho de fundo no corredor garante que ninguém consiga ouvir o que se diz dentro da sala de consulta. O paciente controla o movimento da informação, dentro e fora.
Neste tipo de espaço isolado, é fácil refletir e descobrir pensamentos na beira da consciência. Com este tipo de privacidade, fica mais fácil os pacientes se abrirem.
Porém, essa arrumação bizantina cria certas limitações. Que cônjuge do paciente já não se perguntou: “O terapeuta está captando a história completa?” Dentro da sala de consulta, o terapeuta só ouve a perspectiva do paciente. Tendo-nos colocado numa caixa, como podemos ajudar os pacientes a sair de suas caixas?
Uma solução para o dilema se apresenta quando meu paciente atende àquela ligação telefônica. O isolamento do consultório é despedaçado; o paciente permite que alguém de sua vida entre ali. E eu tenho o privilégio de presenciar a pessoa diante de mim interagindo espontaneamente com aquele mundo.
A maioria dos pacientes lida com uma ligação com um rápido pedido de desculpas; eles desligam seus celulares, surpresos por terem se esquecido de fazê-lo antes de entrar. Alguns selecionam suas chamadas, sempre disponíveis para pessoas selecionadas.
Outras pessoas não ligam para as interrupções e atendem o celular toda vez que sua musiquinha toca. Até mesmo suas conversas breves podem ser reveladoras: “Estou na psiquiatra”, “Estou na Dra. S”. Quem sabe eu não tenho apelidos? Para uma família, eu era a “Grande B” (apesar de eu ser baixinha, mesmo usando salto).
Uma mãe recebe uma ligação de sua filha adolescente. Um tema de nossas sessões tem sido como lidar com o “comportamento exigente” da filha. O volume está alto, então eu consigo escutar a mãe e a filha falando. A filha está insistindo em algo trivial; a mãe é infinitamente paciente, até solícita. Agora eu vejo que a criança não tem recebido feedback consistente de que seu comportamento é problemático. A culpa levou minha paciente a disfarçar sua irritação. Ela se surpreende em saber de mim o quanto ele tem se enganado e o quanto isso é contraproducente.
Quando o marido de outra paciente telefona para saber os resultados de seus exames médicos, sinto sua doçura; isso contrabalanceia meu conhecimento sobre suas dificuldades sexuais.
Um órgão soa do bolso do casaco de outro paciente, um jovem rapaz. “Aposto cem dólares que é minha irmã!”, ele diz. Claramente ela telefona muito para ele, e ele meio que gosta disso. Estranhamente, ele raramente a menciona em sua terapia. Agora eu sei por quê. Ele tinha medo de atrapalhar a doçura de seu relacionamento fraternal ao revelar sua essência competitiva.
Presencio outro paciente, um médico, fazendo malabarismo com diversas ligações: colegas precisam de um conselho urgente; criança quer dormir na casa de um coleguinha; esposa quer pedir que ele traga o jantar; enfermeiros temem infecções de ferimentos, febre, hemorragia. Realmente entendo o estresse envolvido em mudar incessantemente de assuntos de consequência trivial para aqueles casos de vida ou morte.
Às vezes, os pacientes me entregam seus celulares, para que eu leia suas mensagens. Nós as ouvimos e discutimos se discernimos as mesmas implicações sutis nas entrelinhas.
Os pacientes me mostram aquelas telas brilhantes com fotos dos bichinhos de estimação e dos filhos, apartamentos que eles podem alugar, a alergia da semana passada (para um diagnóstico ou para gerar empatia). Vejo a bagunça que se tornou foco das brigas de família: o quarto do filho com toalhas molhadas em cima de roupas limpas; a mesa de jantar desordenada que não permitiu jantares festivos.
Ao tentar compreender a infinita complexidade da mente de um individuo, ajuda centrar o foco fechando o mundo lá fora e criando um lugar de privacidade. Mas, para entender o contexto – a vida que o paciente leva fora do consultório –, ajuda deixar entrar algumas visões e sons. As imagens valem mais que mil palavras; com as vozes é a mesma coisa. Vídeos caseiros, agora disponíveis na maioria dos dispositivos móveis, logo mais vão estrear no meu consultório. Uol Saúde